sábado, 23 de junho de 2012

* Resumo do texto 'As limitações do método comparativo' Franz Boas.


A inovação no estudo antropológico, limitando-se em pesquisar sobre as leis que governavam o desenvolvimento da sociedade e fundamentada na observação de que os mesmos fenômenos étnicos ocorreriam entre os mais diversos povos, fez surgir um crescente interesse público na Antropologia. Anterior a esse novo método de pesquisa acreditava-se que a antropologia não poderia fazer mais do que registros de costumes e crenças de povos estranhos.

Segundo Boas, antes desse novo método, identidades ou similaridades culturais eram consideradas provas incontroversas de conexão histórica ou mesmo de origem comum, a nova concepção de pesquisa se recusou a considera-las como tal, interpretando-as como resultado uniforme da mente humana.

Em relação às ideias universais das diferentes sociedades, o autor diz que sua descoberta é apenas o inicio do trabalho antropológico e propõe a indagação de duas questões: quais são suas origens? Como elas se afirmaram em várias culturas? Em relação à segunda questão, Boas afirma que ideias não existem de forma idêntica por toda parte, pois elas variam. Para ele as causas dessas variações são externas, baseiam-se no ambiente em seu sentido mais amplo e internas fundadas sobre condições psicológicas.

Em relação à primeira questão, Boas enfatiza a dificuldade de tratar sobre as causas que levaram à formação de ideias que se desenvolveram em diferentes lugares habitados pelo homem. A dificuldade de explicar esse fenômeno levou ao surgimento da concepção de que os mesmos fenômenos etnológicos devem-se sempre as mesmas causas.

Para Boas “quando se compara fenômenos culturais similares de várias partes do mundo, a fim de descobrir a história uniforme de seu desenvolvimento, a pesquisa antropológica supõe que o mesmo fenômeno etnológico tenha-se desenvolvido em todos os lugares da mesma maneira.” O autor critica esse método comparativo e diz que “Até o exame mais superficial mostra que os mesmos fenômenos podem se desenvolver por uma multiplicidade de caminhos.”

O autor fundamenta a sua critica através dos exemplos das organizações  totêmicas da sociedade, da arte primitiva e do uso de máscaras como sendo características comuns a diversos povos, mas que não se originaram pelos mesmos fatores. Para Boas, o mesmo fenômeno étnico pode se desenvolver a partir de diferentes fontes.Descobrir os processos pelos quais certos estágios culturais se desenvolveram é um dos objetivos principais da pesquisa antropológica na concepção de Boas. O autor nos diz que os defensores do método comparativo não consideram as diferenças entre o uso indiscriminado de similaridades culturais para provar uma conexão histórica e o estudo detalhado dos fenômenos locais.

Boas critica a similaridade cultural através do ambiente geográfico.  Para ele o meio ambiente exerce um efeito limitado sobre a cultura humana e não encontra fatos que sustentem que o meio seja o modelador primário da cultura. Argumenta que muitos dos povos mais diversos em termos de cultura e linguagem vivem sob as mesmas condições geográficas. Para o autor a comparação histórica de desenvolvimento é muito mais segura do que o método comparativo que estava sendo utilizado, pois esse último baseava-se em deduções primícias.

O autor finaliza enfatizando que o método comparativo somente atingirá seus objetivos quando basear suas investigações nos resultados históricos de pesquisas dedicadas a esclarecer as complexas relações de cada cultura individual. Boas afirma que o método de pesquisa não terá resultados significativos enquanto não renunciar ao propósito de construir uma história sistemática uniforme da evolução da cultura e enquanto não começar a fazer as comparações sobre bases mais amplas e sólidas, que ele se aventurou a esboçar.

 Brenda Rodrigues.

 Referência Bibliográfica:
BOAS, Franz. Antropologia cultural. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2010.

terça-feira, 19 de junho de 2012

*Resenha Argonautas do Pacífico Ocidental


A obra de Malinowski relata sua experiência entre os nativos das ilhas Trobriand e nos relata o Kula, uma prática entre as tribos que dita sobre a vida das aldeias no geral, e de cada pessoa e seus hábitos. A obra ajuda a quebrar modelos que se faziam presentes em etnografias até então, e surge com outras maneiras de estudar “o outro”. 
Malinowski entende as sociedades como um organismo único, onde cada instituição social tem sua funcionalidade. Ele interroga a condição do pensamento antropológico, inova na forma de colher dados no campo, originando novos elementos e fatores de grande importância para a etnologia. 
Em “Os Argonautas do Pacífico Ocidental” ele faz uso de todos os seus recursos metodológicos para analisar o Kula. O Kula pode ser considerado um sistema de trocas que transcende o aspecto econômico e implica numa variedade de objetivos, contando com a questão do simbolismo, envolve várias áreas da vida social, não só a econômica, não depende de uma só variável para acontecer. 
Aprofundando a informação sobre o Kula, Malinowski percebe que os nativos separam as pequenas das grandes expedições. A pequena é chamada de Kula wala e a grande, de Uvalaku. A grande expedição kula é competitiva e possui uma proporção muito maior. O uvalaku difere-se do kula normal por todos os expedicionários participarem das cerimônias; todas as canoas devem ser novas ou reformadas e pintadas; e a característica mais importante é a ideia de receber e não a de dar presente é levada ao extremo. Malinowski apresenta uma série de detalhes, entre a magia da viagem por mar, seus tabus, as crenças e os encantamentos em torno da expedição Kula. 
Seu trabalho ajudou a diminuir a visão passada e errada de sua época, que o nativo não possuía leis e se comportava como um selvagem. O autor almeja mostrar que o Kula é um mecanismo que possui seus significados para aquela cultura assim como a cultura ocidental possui tantos outros também, e que devemos ter olhar cuidadoso aos nossos grupos, categorizações e opiniões ao transferir nosso olhar para o outro. 

Anne Karoline

Resenha dos Capítulos III e XXII do texto: MALINOWSKI, Bronislaw Kasper. Argonautas do Pacífico Ocidental: um relato do empreendimento e da aventura dos nativos nos arquipélagos da Nova Guiné melanésia. 2.ed. São Paulo: Abril Cultural, 1978. (Os Pensadores)


domingo, 3 de junho de 2012

*Fichamento do livro Antropólogos e Antropologia de Adam Kuper: capítulos I e II


I. Malinowski


“O objetivo de estudo da Antropologia foi definido com razoável clareza no início do século XX[...] Sua essência era o estudo do homem ‘primitivo’[...] o estudo da cultura.” (p.12, ¶ 2)
“Malinowski expõe o seu ponto de vista com referencia às preocupações das principais escolas.” (p. 14, ¶ 3)


“A influência do meio ambiente sobre as instituições culturais e a raça é estudada pela Antropogeografia [...] A influência recíproca dos vários aspectos de uma instituição, o estudo do mecanismo social e psicológico no qual a instituição se basea, constituem um tipo de investigação teórica que, até ao presente, só se praticaram de um modo conjectural. Mas arrisco-me a predizer que mais cedo ou mais tarde adquirirão certa personalidade própria”. (p. 14, ¶ 4)


“Radcleffe-Brown escreveu de um modo mais seguro e direto.” (p.15,¶ 1)


“Creio que, de momento, o conflito realmente importante nos estudos antropológicos não se trava entre os ‘evolucionistas’ e os ‘difusionistas’ nem entre as varias escolas de ‘difucionistas’, mas entre a história conjectural, de um lado, e o estudo funcional da sociedade, do outro.” (p.15, ¶ 2)


“A contra influência de Durkheim e da sua Escola de Paris, a qual atraíra as atenções de Radcleffe-Brown [...] antes da I Guerra Mundial e que continuou a influenciar os antropólogos sociais britânicos.” (p. 15, ¶ 4)


“O enfoque funcionalista não era visto como algo que desejaria as preocupações evolucionistas e difucionastas mas, outrossim, como algo que deveria ser-lhes adicionados.” (p. 19, ¶ 3)


“Era essa opinião do próprio Malinowski. Ele manteve-se evolucionista durante toda a sua carreira e, a semelhança dos seus colegas ortodoxos, acreditava que a coleta de fatos cuturais vivos iria gerar, em ultima analise, leis evolucionistas.” (p. 19, ¶ 4)


“Doente demais para continuar suas pesquisas científicas. [Malinowski] Desesperado decide distrair-se com a leitura de um clássico inglês, escolhe The Golden Bough e coloca-se imediatamente ao serviço da antropologia franzerina.” (p.21, ¶ 1)


“Na época em que estava centralizado seus exames para obtenção do doutorado, leu pela primeira vez The Golden Bough, e isso, afirmou por diversas vezes, foi o que fez dele um antropólogo.” (p.22, ¶ 2)


“Em Leipzig decidiu depois diversificar seus interesses e estudou Psicologia Experimental, sob a direção de Wundt, e História Economica, com Bübher.” (p.22, ¶ 3)


II. Radcliffe-Brown


“Malinowski trouxe um novo realismo para a antropologia social, com sua percepção aguada dos interesses reais subentendidos no costume e suas técnicas radicalmente novas de observação. Radcliffe-Brown, por sua vez, introduziu a disciplina teórica da Sociologia francesa e veio em ajuda dos novos pesquisadores de campo com uma bateria mais rigorosa de conceitos.” (p. 51, ¶ 1)


“Radcliffe-Brown sofreu a influência das teorias sociológicas de Durkheim antes da I Guerra Mundial.” (p. 52, ¶ 2)


“Radcliffe-Brown dividiu os ‘costumes’ em três tipos: técnico, regra de comportamento e aquilo a que chamou ‘costume cerimoniais’, nos quais concentrou sua atenção.” (p. 58, ¶ 4)
“A sociologia de Durkheim foi a mais importante influência sobre o pensamento maduro de Radcliffe-Brown, mas ele também permaneceu um evolucionista na tradição de Spencer.” (p 65, ¶ 2)


“Apesar das menções iniciais há uma explicação ‘cultural’ e ‘psicológica’, a sua orientação desde 1910 foi definitivamente psicológico. Para ele, a sociologia significava uma espécie de trabalho realizado por Durkheim e, acreditava às vezes Steinmetz e Westermarck, mas não era certamente a corrente geral de pesquisa e reportagem social
que passava por sociologia nos EUA. Ignorava, segundo tudo leva a crer, a obra de Weber e Simmel, mas as teorias destes só se tornaram amplamente conhecida na Grã-Bretanha na década de 1940.” (p.65, ¶ 3)


“Poderíamos resumir o desenvolvimento desde Durkheim até Mauss e Radcliffe-Brown dizendo simplesmente que os estudos de Malinowski nas Ilhas Trombiand se situaram de permeio. Curiosamente, eles influenciaram mais o trabalho Mauss do que o de Radcliffe-Brown, e o próprio Malinowski não tardaria em afastar-se das preocupações das idéias de Durkheim.” (p.67, ¶ 3)


“Radcliffe-Brown dedicou-se mais ao estudo das relações sociais.” (p.67, ¶ 4)


“A forma estrutural esta explicita em ‘usos sociais’, ou normas sociais, os quais se reconhece geralmente como obrigatórios e são largamente observado. Portanto, esses usos sociais tem as caracteristicas dos ‘fatos sociais’ de Durkheim, mas Radcliffe-Brown insistiu, uma vez mais, em que eles não eram deduzidos mas sim observados.” (p.69, ¶ 3)


“A especialidade de Radcliffe-Brown era o sistema de parentesco e foi esse o campo em que teve maior liberdade para desenvolver os seus próprios ‘insights’, uma vez que Morgan e Rivers tinham-se baseado em explicações históricas dos sistemas de parentesco e a escola de L’Année Sociologique negligenciara inteiramente o tópico.” (p.74, ¶6 – p. 75, ¶ 1)


Anny  Karoline 



Referências Bibliográficas


KUPER, A. Malinowski. In: KUPER, A. Antropólogos e Antropologia. Rio de Janeiro: F. Alves, 1978. p.11-48.
KUPER, A. Radcliffe-Brown. In: KUPER, A. Antropólogos e Antropologia. Rio de Janeiro: F. Alves, 1978. p.51-84.

terça-feira, 29 de maio de 2012

*Fichamento do texto: História da Antropologia

Na Grã-Bretanha, a ruptura com o passado foi radical. Radcliffe-Brown e Malinowski proclamaram uma revolução intelectual e criticaram acerbamente alguns dos seus professores. (p. 51§ 3)

As vezes, antropólogos sociais ingleses, principalmente, sustentam que Radcliffe-Brown e Malinowski, mais ou menos independentemente, criaram a antropologia moderna. Essa talvez fosse a impressão na metade do século, quando a antropologia americana se subdividira em muitas áreas especializadas e os alunos de Mauss ainda não haviam se destacado. Em contraste, a "ciência do parentesco" ("kinshipology")(capítulos 4 e 5) britânica parecia firmar-se sobre um método criado por Malinowskie uma teoria desenvolvida por Radcliffe-Brown, consolidando-se como uma "ciênciada sociedade".(p. 52 § 2)



Argonauts ..., a primeira grande obra de Malinowski, continua sendo também a mais famosa. o livro foi prefaciado por Sir James Frazer, que não poupou elogias ao jovem polonês, claramente inconsciente de que, num sentido acadêmico, ele estava assinando sua própria sentença;a de morte. O volumoso livro e escrito com fluência. [...] Contemporâneo e conterrâneo do romancista Joseph Conrad, Malinowski produziu informações  do "coração das trevas", na forma de imagens matizadas e naturalistas dos trobriandeses, os quais no fim emergem não como espetaculares, exóticos, nem como "radicalmente diferentes" dos ocidentais, mas simplesmente como diferentes. (p. 56 § 2)

De forma mais convincente do que qualquer argumento teórico, a obra de Malinowski revelou o absurdo de um projeto comparativo que se propusesse a comparar características individuais. De agora em diante, contexto e inter-relações seriam qualidades essenciais de qualquer explicação antropológica. (p. 57 § 3)



De modo geral, os antropólogos posteriores a Malinowski receberam suas concepções te6ricas com menos entusiasmo do que seus métodos e sua etnografia. Sua posição teórica era basicamente eclética, mas seguindo os padrões correntes ele denominou seu programa de funcionalismo. Todas as praticam e instituições sociais eram funcionais no sentido de que se ajustavam num todo operante, ajudando a mantê-lo. Diferentemente de outros funcionalistas que seguiam Durkheim, porem, para Malinowski o objetivo ultimo do sistema eram os indivíduos, não a sociedade. (p. 57 § 4)


Isso era individualismo metodol6gico sob outro disfarce, e num clima acadêmico coletivista dominado pelos durkheimianos, o programa a não teve boa acolhida Durante algumas décadas depois de sua morte a estrela de Malinowski continuou seu ocaso, ate que a desilusão com a "Grande Teoria" tomou conta de todos durante a década de 1970, fato que o levou a reabilitação em comunidades antropol6gicas nos dois lados do Atlântico - às custas do seu colega e rival Radcliffe-Brown. Malinowski chamou a atenção para o detalhe e para a importância de captar o ponto de vista do nativo, e parte de sua reação contra seus predecessores imediatos nasceu de um profundo ceticismo com relação a teorias ambiciosas. Percebemos aqui a semelhança com Boas, reflexo da educação alemã de ambos. Malinowski se distinguia de Boas, porem, em sua relutância em envolver-se com qualquer forma de reconstrução histórica. Com Radcliffe-Brown de empreendeu uma campanha antievolucionaria- e anti-hist6rica - tão bem-sucedida que o tema ficou mais ou menos proibido na antropologia britânica durante quase meio século. (p. 58 § 1)


Malinowski se autodenominava funcionalista, mas suas idéias diferiam fundamentalmente do programa rival do estrutural-funcionalismo. Para Malinowski, o individuo era o fundamento da sociedade. Para os estruturais-funcionalistas durkheimianos o individuo era um epifenômeno da sociedade e de pouco interesse intrínseco o que interessava era inferir os elementos da estrutura social. Essas duas linhagens da antropologia social britânica - funcionalismo biopsicológico e estrutural-funcionalismo sociológico - evidenciam urna tensão básica na disciplina entre o que mais tarde foi chamado de agência e estrutura. O individuo tem agência no sentido de que ele e um criador da sociedade. A sociedade impõe estrutura sobre o individuo e limita suas opções. Como mostra Giddens (1979), os dois pontos de vista são complementares. Mas isso não foi percebido pela antropologia britânica do período entre as duas grandes guerras. O funcionalismo de Malinowski e o estrutural-funcionalismo de Radcliffe-Brown foram vistos como diametralmente opostos. (p. 58 § 2)


Pouco depois dessa publicação, Radcliffe-Brown leu a obra-prima de Durkheim, The Elementary Forms of Religious Life. Ele então ministrou uma longa serie de palestras sobre Durkheim em Oxford, e quando sua monografia, Andaman Islanders, foi finalmente publicada em 1922, mais do que qualquer outra coisa ela parecia uma demonstração admirável de sociologia durkheimiana aplicada a materiais etnográficos. (p. 59 §1)Como Boas e Malinowski, Radcliffe-Brown passou os anos intermediários entre as duas grandes guerras conquistando adeptos e desenvolvendo instituições acadêmicas dedicadas a nova antropologia. Diferentemente deles, porem, ele passou longos períodos de sua vida profissional como nômade acadêmico, desenvolvendo e aperfeiçoando centros antropol6gicos importantes na Cidade do Cabo, Sydney e Chicago. [...] A antropologia inglesa do período entre as duas grandes guerras passou assim por duas fases: primeiro, um período dominado pela etnografia detalhada com ênfase regional no Pacifico, depois, um período volta do para a análise estrutural durkheimiana, com ênfase na África. (p.59 § 2)


Radcliffe-Brown foi seguidor de Durkheim ao considerar 0 individuo principalmente como produto da sociedade. Enquanto Malinowski preparava seus alunos para irem a campo e procurarem as motivações humanas e a lógica da ação, Radcliffe-Brown pedia aos seus que descobrissem princípios estruturais abstratos e mecanismos de integração social. Embora o contraste seja frequentemente exagerado nos relatos hist6ricos, as vezes 0 resultado foram estilos de pesquisa consideravelmente diferentes.(P. 59 § 3)


Os "mecanismos" que Radcliffe-Brown esperava identificar eram de origem durkheimiana, análogos talvez as representações coletivas de Durkheim. Mas Radcliffe-Brown alimentava esperanças explicitas de transfomar a antropologia numa ciência “real”, um objetivo que provavelmente não fazia parte dos planos de Durkheim.(p.59 § 4)


Na obra de Radcliffe-Brown a estrutura social existe independentemente dos atores individuais que a reproduzem. As pessoas reais e suas relações são meras agenciações da estrutura, e o objetivo ultimo do antropólogo é descobrir sob o verniz de situações empiricamente existentes os princípios que regem essa estrutura. Esse modelo formal, com suas unidades nitidamente definidas e logicamente relacionadas, demonstra claramente a intenção "cientifica" do mestre. (p.60 § 1)


A estrutura social pode ser ainda mais desdobrada em instituições discretas ou subsistemas, como os sistemas para distribuição e transmissão da terra, para a solução de conflitos, para a socialização, para a divisão do trabalho na família, etc. - os quais contribuem todos para a manutenção da estrutura social como um todo. De acordo com Radcliffe-Brown, essa e a função é a causa da existência desses sistemas. Temos aqui um problema. Radcliffe-Brown parece afirmar que as instituições existem porque elas mantêm o todo social; isto e, que sua função e também sua causa. A relaçao de causa e efeito se toma vaga e ambígua, e esse raciocínio "tautológico" ou"para trás" e em geral visto com restrições nas explicações cientificas. Essa crítica a, porem, se aplica  igualmente a todas as formas de funcionalismo, inclusive, mas não limitada, à variação de Radcliffe-Brown sobre o tema. (p. 60 § 2)


A articulação feita por Radcliffe-Brown entre teoria social durkheimiana e  materiais etnográficos e suas ambições no interesse da disciplina geraram um programa de pesquisa novo e atraente a que afluíram pesquisadores talentosos, fato que por sua vez aumentou o prestigio da teoria. [...] O uso durkheimiano, por parte de Radcliffe-Brown, da antiga ideia de Maine do parentesco como sistema "jurídico" de normas e regras tomou possível explorar cabalmente o potencial analítico do parentesco. Um sistema de parentesco era facilmente compreendido como uma constituição não escrita de interação social, um conjunto de regras para a distribuição de direitos e deveres. O parentesco, em outras palavras, era novamente uma instituição fundamental, agora como motor (ou coração ao,para usar as analogias biológicas preferidas de Durkheim) de uma entidade auto-sustentável e integrada organicamente, e todavia abstrata, chamada estrutura social (um termo que, a propósito, foi usado pela primeira vez por Spencer). (p.60 § 3)


O próprio Radcliffe-Brown não simpatizava particularmente com a palavra "cultura". Para ele, a questão central não era o que as nativos pensavam, aquilo em que acreditavam, como ganhavam a vida ou como haviam chegado a ser o que eram, mas sim como sua sociedade era integrada, as "forças",que a mantinham coesa como um todo. (p. 61 § 1)


Radcliffe-Browl1 criticava severamente a "historia conjetural" dos evolucionistas. Na visão dele, arranjos contemporâneos existiam porque eram funcionais no presente, certamente não como "sobreviventes" de épocas passadas. Eles faziam sentido no presente ou então não tinham sentido nenhum. Ele também escarnecia das reconstruções freqüentemente fantasiosas apresentadas por historiadores culturais e difusionistas. Onde não existiam evidencias não havia motive para especular. Aqui Malinowski e Radcliffe-Brown concordavam perfeitamente. (p. 61 § 2)


Assim, Boas e Mauss concordavam em que não havia conflito profundo entre história cultural e estudos sincrônicos, e por isso ambos se interessavam pelo difusionismo, enquanto Radcliffe-Brown e Malinowski consideravam esses interesses como "não científicos". Essa divisão reflete claramente o fato de que dois antropólogos britânicos estavam envolvidos numa "revolução", ao passo que na França e nos Estados Unidos predominava uma atmosfera de continuidade. Mas outras divisões eram igualmente importantes. Radcliffe-Brown e Mauss concordavam em que seus estudos faziam parte de urn grande projeto de sociologia comparada, enquanto Boas, dos quatro 0 menos relacionado com a sociologia, desconfiava da "ciência francesa" que Radcliffe-Brown pregava em Chicago e duvidava profundamente do metodo comparativo. De sua parte, Malinowski parece ter evitado toda forma de comparação. Nesse caso, a herança germânica  de Malinowski e Boas une-os claramente contra a "escola francesa". Mas essa unidade também e incompleta. Enquanto Radcliffe-Brown e Mauss eram coletivistas metodológicos comprometidos que investigavam os segredos da "sociedade como um todo", Boas e Malinowski eram particularistas (alemães). Oparticularismo de Malinowski, porem, voltava-se para as necessidades físicas do individuo, ao passo que Boas acreditava na primazia da cultura. (p. 66-67 § 1) 


Nayanny de Lima
Fonte Bibliográfica: 

ERIKSEN, Tomas H. Nielsen, FINN S. História da Antropologia. 4 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010 ( cap.3)

domingo, 27 de maio de 2012

*A vida Sexual dos Selvagens - Malinowski





Ao introduzir o texto, Malinowski nos fala sobre a escolha do título dizendo que o intuito de ser natural e simples é para contribuir com a reabilitação do termo sexual, de que tanto se tem abusado. E para revelar o que realmente o leitor irá encontrar. O autor faz uma certa comparação, em relação aos europeus, ao dizer que o sexo para os habitantes da ilhas do pacífico não é uma simples questão fisiológica. Ele implica o amor e o namoro. É o núcleo das instituições e inspira a arte. Constitui a fonte de sua magias e sortilégios.

A exposição dos fatos essenciais da vida, segundo o autor, devem ser expostos de maneira simples e completa, embora numa linguagem científica. Com esse procedimento, a pesquisa não ofenderá os leitores. É interessante a justificação de Malinowski sobre as comparações que iremos encontrar em seu texto. O autor diz que recorreu a elas, pois para explicar fatos estranhos é indispensável traduzi-los em fatos familiares. Explica que a arte e a dificuldade do trabalho de campo sociológico consiste em partir dos elementos familiares na cultura estrangeira, e aos poucos transformar o estranho e o diferente em um esquema compreensível.

Malinowski delimita a sua abordagem no capítulo I: "O homem e a mulher nas ilhas Trobiand, suas relações no amor, no casamento e na vida tribal". A atração pelo outro sexo e os episódios passionais que dela decorrem, para uma pessoa de qualquer sociedade, constituem-se nos acontecimentos mais significativos de existência humana, afirma o autor. Desse modo, aquilo que significa a suprema felicidade para o indivíduo deve ser considerado um fator básico para o estudo cientifico da sociedade humana.

As práticas amorosas, segundo o autor, são influenciadas pelo modo como os sexos se encaram um ao outro, em público ou em particular. Também são influências de suas situações respectivas em leis e nos costumes tribais, pela maneira como participam de jogos e divertimentos, e pela parcela que cabe a cada um na labuta do dia-a-dia. Malinowski chama atenção para as relações de um trobiandês com seu pai, sua mãe e o irmão de sua mãe, por ser o núcleo do sistema direto materno ou matrilinearidade, e também por esse sistema governar toda a vida social dos nativos.

Ao iniciar o capítulo V, o autor nos diz que o marido e a mulher, na ilhas Trobriand, levam sua vida em estreito companheirismo. Trabalham lado a lado, partilham alguns dos deveres domésticos e passam uma boa parte do seu lazer juntos. Reciprocidade e harmonia reinam em suas relações. Os meses iniciais do casamento não apresentam, para os nativos, interesses predominantemente sexuais. A mudança de status social e a alteração que se processa em suas relações são as suas maiores preocupações. As primeiras noites do casamento constituem um período de abstinência sexual, pois o casal passandoa morar na casa dos pais se sentem constrangidos diante dessa situação. É interessante a abordagem de assuntos comuns aos nossos dias, como o ciúme e o adúlterio. Esses que são os dois fatores da vida tribal que mais põem à prova o vínculo matrimonial dos nativos.

  O autor nos conta histórias que provam a existência de fortes paixões e sentimentos complexos entre os nativos. Examinando o casamento sob seu aspecto doméstico e do ponto de vista das obrigações econômicas e legais que ele impõem à família da mulher ao casal e falando sobre os efeitos decorrentes da poligamia do chefe exercidos sobre a vida pública e política, é o  resumo do capítulo V para o próprio autor.A pesquisa de Malinowski sobre "A vida sexual dos selvagens"  nos incentiva a uma possível etnografia sobre práticas sexuais atuais que causam preconceitos em nossa sociedade. Durante a leitura, percebemos a preocupação do autor em não distinguir o que é bom ou ruin, mas nos transmitir os reais valores em cada atitude cultural dos nativos.

Brenda Rodrigues.

 (A pesquisa de Malinowski foi realizada no Noroeste da Melanésia)



Fonte Bibliográfica: 
MALINOWSKI, Bronislaw. A vida Sexual doas Selvagens. Rio de Janeiro: F. Alves , 1982.